“Quanto isso custa?” Essa pergunta é feita por todos nós, em algum momento, seja para assuntos pessoais ou profissionais. O que realmente importa neste caso é saber se a informação sobre o custo é realmente a que você acredita que seja e o que você vai fazer com essa informação. Vou exemplificar com dois casos.
Caso 01: O dono de uma pequena empresa fabricante de itens de ferragens no Rio de Janeiro/RJ, analisou a operação da empresa (que vinha há anos trabalhando quase sem lucro) e decidiu fazer uma campanha comercial do seu produto principal, dando ótimas condições de pagamento e não cobrando o frete. Meses depois as vendas do seu produto principal aumentaram em mais de 50%, mas ele começou a ter prejuízo. Analisamos tudo juntos e logo percebemos que ele havia precificado mal o seu produto, porque tinha calculado errado os seus custos. Estamos falando de um profissional com 20 anos de experiência, formado em Administração de Empresas, assessorado por um Gerente Administrativo também formado em Administração de Empresas.
Caso 02: Em uma empresa multinacional com um faturamento anual no Brasil de centenas de milhões de dólares, vinha operando por cinco anos consecutivos com um ritmo crescente de produtividade operacional, melhor crescimento dentro das 60 fábricas do grupo. Em um determinado momento, o Diretor da empresa analisou uma série de relatórios sobre custos e percebeu uma variação enorme entre as perdas de materiais apontadas na produção e as diferenças de custo dos materiais consumidos. Foi feita uma sindicância, onde, sem qualquer aviso prévio, uma equipe pegou todas as perdas de produção de um turno e as contabilizou. Os relatórios das perdas de materiais, feitos pelos chefes de produção, apontava uma perda de U$50,00 no turno e a contagem independente contabilizou uma perda de mais de U$30.000,00 no mesmo turno. Ao perceberem que estavam sendo controlados, os chefes de produção logo trabalharam em cima dos problemas e, em menos de duas semanas, as perdas chegaram a U$30,00 por turno. Olhando depois os relatórios do passado, e o quão rápido foi a resposta da equipe para solucionar os problemas, conseguimos estimar uma perda evitável de mais de U$40 milhões. Bastava alguém ter analisado os relatórios de custos que já existiam.
Os exemplos acima estão longe de serem isolados, na realidade, mesmo com grande empenho dos gestores em cortar, levantar e gerenciar os custos, falhas pontuais e sistêmicas sobre o assunto acontecem o tempo todo, seja por desconhecimento, erros operacionais ou por não trabalharem com ERP que consiga apoiar todo o trâmite de coleta e tratamento das informações de custos. Este é um ponto realmente relevante para as empresas e que, atualmente apresenta meios de fazer muito mais ações para melhorar isso.
Alinhando conceitos sobre custos
Eu imagino que você que está lendo este artigo tem algum conhecimento sobre Gestão de Custos, mas, para evoluirmos sobre o tema, alinharemos alguns conceitos sobre o assunto:
Pacote básico de entendimento: terminologias
- Custo: é um tipo de gasto, que representa bens e serviços utilizados na produção de outros bens e serviços.
- Gasto: é o sacrifício financeiro de uma empresa para a aquisição de qualquer coisa.
- Desembolso: é o pagamento resultante de um gasto.
- Despesa: bem ou serviço consumido direta ou indiretamente e intencionalmente para a obtenção de uma receita.
- Perda: bem ou serviço consumido de forma anormal e involuntária.
- Investimento: é um gasto ativado, em relação a sua vida útil ou de benefícios atribuíveis a benefícios futuros.
Classificações dos custos:
- Custos Diretos (CD): são custos alocados diretamente a cada produto fabricado sem a necessidade de rateio ou estimativas.
- Custos Indiretos (CI): são custos apropriados aos produtos fabricados mediante rateio ou estimativa, por não poderem ser identificados de forma precisa na composição dos custos dos produtos.
- Custos Fixos (CF): são os custos que não sofrem variação em razão do custo de produção.
- Custos Variáveis (CV): são os custos cujos valores totais variam de acordo com a quantidade produzida, de forma proporcional.
- Custos Semifixos (CSF): são os custos que se mantém quase fixos, mas reagem ao ritmo da produção.
- Custos Semivariáveis (CSV): são os custos que variam com o nível de produção que, no entanto, tem uma parcela fixa mesmo que nada seja produzido. Ex.: Energia elétrica onde o contrato indica que o custo é fixo até um determinado consumo, mas, atingindo esse valor o custo torna-se variável.
- Custo Primário (CP): é a soma dos custos de matéria-prima (MP) e mão de obra direta (MD): CP=MP+MOD
- Custo de Transformação (CT): é a soma dos custos da mão de obra direta (MOD) e os custos indiretos de fabricação (CIF): CT=MOI+CIF
- Custo de Produção (CP) ou de Fabricação: é a soma dos custos da matéria-prima (MP), da mão de obra direta (MOD) e dos custos indiretos de fabricação (CIF): CP=MP+MOD+CIF
Agora, temos condições de trabalhar os pontos relacionados à Gestão de Custos.
As técnicas mais básicas e amplamente utilizadas são as de Custeio Direto Variável (algumas literaturas chamam de Custeio Variável) e Custeio Por Absorção, onde, a princípio, para uma empresa conseguir uma boa gestão pode utilizar ambas, simultaneamente.
Custeio direto variável
Trabalha com os Custos Fixos e Custos Variáveis, é uma ferramenta muito interessante para as atividades gerenciais e é um método onde somente os custos claramente apropriados aos produtos devem ser trabalhados.
Vantagens: Não esconde o lucro no estoque. Por separar bem os Custos Fixos dos Custos Variáveis, ele tem meios interessantes para simular situações para tomadas de decisões e é de fácil entendimento para os gestores de empresas.
Desvantagens: Não é aceito pelo fisco e fere os princípios da contabilidade atual.
Custeio por absorção
Trabalha com os Custos Diretos e Indiretos, sendo que os custos incorridos na produção são alocados por rateio, sofrendo influência direta do volume produzido.
– Vantagens: atende ao fisco e as normas contábeis, só é considerado como custo a parcela dos materiais utilizados na produção.
– Desvantagens: o uso do modelo de rateio pode beneficiar alguns produtos/serviços e penalizar outros.
Ferramentas apoiadas pelas técnicas de custeio
01) Precificação
Devido a sua aderência às regras fiscais e contábeis, aqui deve ser utilizado as informações de custos de produtos/serviços gerados pelo Custeio Por Absorção. Atualmente existe inúmeras formas de precificar o que se vende, leva-se em conta vários fatores simultaneamente, mas a base de formação de preço utilizada por grande parte dos gestores de empresa é o Markup. O Markup relaciona valores das despesas com as receitas líquidas de vendas e o lucro desejado.
Markup Divisor (MKD): (Preço de Venda (PV) – Custo Total de Venda(CTV))/100
Markup Multiplicador (MKM): 1/MKD
02) Margem de contribuição
Excelente ferramenta gerencial, que analisa a parcela do preço que está sendo disponibilizado para a cobertura dos custos fixos e para a geração de lucros.
Margem de Contribuição (MC): Preço de Venda (PV) – Custos Variáveis (CV)
03) Análise de ponto de equilíbrio
Ferramenta de análise que representa o nível de vendas necessárias para cobrir as despesas operacionais, é o ponto onde as despesas e receitas se anulam. Ela apoia tomada de decisão em relação a variação de preços, aplicação ou não de campanhas comerciais, terceirizações, etc.
Lajir = (P x Q) – CF – (CV x Q)
Lajir = Lucro antes de Juros e Imposto de Renda (Lucro Operacional)
P = Preço Unitário de Venda
Q = Número de Unidades Vendidas
CF = Custo Fixo Por Período
CV = Custo Operacional Variável Por Período
Com isso, quando o Lajir = 0; Q = CV / (P-CV)
Sobre Custo ABC
Activity Based Costing é um método muito interessante de pensar e trabalhar com custos. A ideia básica é atribuir primeiramente os custos às atividades e posteriormente atribuir custos das atividades aos produtos.
Sendo assim, faz-se o rastreamento dos custos que cada atividade proporcionou, depois os custos são atribuídos a cada uma delas, e posteriormente verifica-se como os portadores finais de custos consumiram serviços das atividades, atribuindo-lhes os custos relacionados. Esta metodologia, trabalha bem com o Custeio Por Absorção, visto que, uma das grandes vantagens do modelo é a mitigação das falhas dos rateios de custos.
Como os ERP trabalham com Gestão de Custos?
Agora que já alinhamos os conceitos básicos de custos, vamos ver como tem sido trabalhado por e com os ERP e comentar os pontos de fragilidade e de ganhos potenciais nisso tudo.
01) Você sabe gerenciar custos?
Em implantação de ERP, em uma empresa de médio porte na área de equipamentos, que tinha uma área separada de Custos, um gerente queria começar a implantação do ERP pela área de Custos, porque ela era muito importante e que tínhamos que colocar todos os recursos de custeio, com todos os dados reais de operação, em duas semanas (a expectativa do projeto todo era de um ano). Ninguém disse para ele que Custos é uma operação de resultado e que a sua implantação depende de todas as outras atividades da empresa estarem em andamento.
Imagina o que acontece nas empresas onde não existe a cultura de Gestão de Custos e que vão implantar um ERP. Muitas dessas empresas não têm sequer condições de selecionar os requisitos básicos que um ERP tem que ter para atender às suas necessidades legais e gerenciais de custeio.
02) Saber os custos, custa
A princípio, em todos os ERP que se predispõe a realizar a Gestão de Custos de uma empresa, eles captam todas as informações necessárias para executar esta tarefa diretamente das operações, para isso todos os cadastros e parâmetros devem estar definidos e as regras de negócio dos processos relacionados aos custos implementados, mas veja só, eu disse “a princípio”.
Vivemos num mundo discíncrono, onde mesmo que inúmeras técnicas e recursos informatizados estejam disponíveis, muitas empresas não as utilizam, com isso vemos várias empresas industriais e de serviços realizando tarefas de coletagem, revisão e inclusão de dados de forma totalmente manuais, gerando grandes custos.
Outro ponto a ser considerado é que, mesmo se a sua empresa determinar que vai utilizar somente os recursos mais básicos de custeio e que vai trabalhar somente com as informações trabalhadas regularmente no ERP, muitos sistemas ainda têm custos operacionais (que poderiam ser evitados ou reduzidos) de operação desses processos de gerenciamento de custo.
O grau de detalhamento dos custos, a velocidade que as informações precisam ser trabalhadas, a criticidade do seu processo e os recursos de Gestão de Custos do seu ERP vão determinar quão cara ou barata essa atividade vai sair para a sua empresa.
03) O que temos que falar sobre os Centros de Custo
Veja se a história lhe parece familiar: em um determinado momento, a empresa decidiu trocar o seu ERP atual, e com isso, durante a implantação, foi decidido que os Centros de Custo seriam revistos. A revisão ocorreu mudando vários pontos, e com isso, todo o histórico do ERP anterior não pode ser migrado para o ERP atual, forçando a empresa a manter os relatórios antigos junto com o ERP novo. Com o passar do tempo, chefes e gerentes foram sendo substituídos e a visão de custos promovido pela estrutura operante não atende mais. Assim os gestores das áreas têm que tomar uma decisão: vou alterar o que preciso e, de algum jeito, manter o passado como está? Vou alterar o que preciso, alterando todo o passado gerencial trabalhado e processado? Vou deixar tudo como está e vou trabalhar com planilhas eletrônicas para fazer análises?
Mudanças nos Centros de Custo sempre geram algum trabalho. A forma mais interessante que já utilizei foi definir muito bem uma estrutura principal e trabalhar com uma granularidade das informações que possam facilitar as mudanças, por exemplo: Centro de Custo: Energia Elétrica, com a subdivisão: para a área industrial e para a área administrativa.
A alocação de Centro de Custo como área de negócio também é muito utilizada nas empresas, sendo que as vezes isso é feito de forma muito básica e ineficaz. Se vai utilizar desta forma, coloque as divisões de uso dentro de cada área ou, caso o seu ERP tenha este recurso, utilize, de forma combinada, uma classificação financeira.
Os ERP precisam ter meios para tratar mais facilmente as mudanças estruturais dos Centros de Custo, seja para tratar migrações de sistemas ou para mudança das estruturas de contas. Essas facilidades podem ser recursos para realinhamentos por lotes de lançamentos com possibilidades de ajustes manuais, isso já ajudaria bastante.
04) Simulações de Custos: isso tem que existir num ERP
Se o dissídio dos funcionários for de 8% quais serão os impactos nos meus custos totais? E na família de produtos X? Ou somente no produto X1? Quais são os meus custos em dólar? Qual o impacto da flutuação do câmbio do dólar em relação aos meus custos? Se eu alterar a base de rateio dos meus ativos de tempo de uso para valor agregado, como isso impacta nos meus custos?
Seu ERP precisa ter isso. Infelizmente a grande maioria dos ERP não tem recursos de simulações, e os que tem, não chegam perto desse tipo de flexibilização de análise.
05) Gestão das mudanças das operações/informações, custos e os riscos fiscais
Os materiais que você utiliza para produzir alguma coisa, ou quando associado a entrega de algum serviço, e os processos que você utiliza para produzir ou realizar um serviço fazem parte na construção dos custos padrões e reais que a sua empresa tem. Todas essas mudanças precisam ser gerenciadas por Custos, e os seus impactos tratados pelas ações fiscais da empresa. O problema é que isso não costuma acontecer muito bem.
06) Repensando os rateios
Toda a base do Custeio Por Absorção é feita por rateios, onde uma série de custos são distribuídos aos produtos/serviços através de regras. O problema está na forma como isso é feito, nas suas dinâmicas e nas limitações das possibilidades de definição dos fatores de rateio.
Muitos ERP que se predispõem a gerenciar custos definem os seus fatores de rateio com base no custo ponderado dos materiais/serviços de cada produto, alguns até colocam avaliação de volume ou peso ponderado, outros tem a possibilidade de atribuição manual de rateios. Alguns ERP trabalham produto a produto, sem condições de trabalhar famílias de produtos e outros, pelo contrário, só conseguem trabalhar famílias. Tudo isso sendo feito de forma pontual e precisando de intervenção manual.
Os ERP, em essência, deveriam ter a capacidade de formatar regras mais complexas de rateios dos custos, conta a conta de custeio, com visões pontuais e por múltiplas famílias, tudo isso com uma dinâmica automatizada de ajustes por período de tempo e/ou evento, deixando para as pessoas somente a necessidade de revisar e aprovar as mudanças.
07) Onde está o custeio ABC que deveria estar aqui?
Já entramos na maturidade em gestão empresarial onde não é mais para questionar se um ERP deve ou não ter meios para trabalhar com Custeio ABC e sim com qual estrutura ele vai trabalhar. As empresas, por outro lado, devem decidir quão madura estão as suas operações e os seus sistemas de informação para começarem a trabalhar com Custeio ABC. Algumas empresas podem nunca precisar disso.
08) Por que os recursos de ponto de equilíbrio são tão ruins nos ERP?
Muitos ERP não têm nada relacionado a geração e utilização do Ponto de Equilíbrio da empresa, outros fornecedores de ERP colocam um campo no sistema para que o usuário preencha um valor de Ponto de Equilíbrio, mas não usam para nada. Alguns ERP de mercado calculam o Ponto de Equilíbrio, mas trabalham de forma agregada e com pouco ou nenhum recurso de simulação.
Ponto de Equilíbrio é uma ferramenta muito versátil, que deve ser calculada com os modelos tradicionais de agregação de informação, mas precisa ter ferramentas de simulação de forma desagregada, não basta dizer que você vai aumentar ou precisa aumentar as suas vendas em uma determinada quantidade de unidades, mas precisa analisar os impactos específicos de um ou mais produtos e/ou as suas famílias. Outra situação a ser viabilizada pelo ERP é a capacidade de simulação do Ponto de Equilíbrio por unidade de negócio e por contratos/projetos vendidos.
09) Indo além dos cálculos das margens de contribuição
Quando definida as margens de contribuição de um determinado produto estamos definindo um preço padrão dele. Esse cálculo é impactado pelo volume de vendas obtido. Por que não ter rotinas de re-cálculos automáticos de margem de contribuição por períodos de tempo ou por eventos? Por que não ter cálculos de margem de contribuição por unidades de negócio ou de projetos/contratos? Outro ponto relevante é o uso de margem de contribuição com elementos em cascata, usada em algumas negociações de vendas entre empresas (B2B).
10) A Integração dos custos com os preços, temos que evoluir nisso
As metodologias de precificação são bem abrangentes, mas na grande maioria dos casos, os custos envolvidos são a base para a sua formação. Por que então a maioria dos ERP não tem meios de re-cálculos automáticos de preços (colocados como preços sugeridos) quando há uma mudança expressiva e/ou estrutural dos custos?
Agora imagina as operações entre empresas do mesmo grupo, com milhares de produtos com preços em STP (Standard Transfer Price) onde centavos (ou até décimos de centavos) podem ter grandes impactos no negócio. Dá para fazer melhor!
11) É preciso aumentar a nossa capacidade de entender e gerenciar custos dos serviços dentro dos ERP
Nas fábricas de médio/grande porte é comum encontrarmos profissionais e sistemas especializados em custos, já nas médias/grandes empresas de serviços até encontramos, em alguns momentos, profissionais de custos, mas raramente eles têm ferramentas nativas no ERP para Gestão de Custos dos Serviços, e assim partem direto para planilhas eletrônicas. Se o fornecedor de ERP trabalhar com flexibilização nos processos de custeio, eles poderão ter sistemas que se adaptem a qualquer realidade.
12) A Dinâmica do Custeio
Custo é um ente dinâmico. Custos mensais, visões agregadas anuais e análises somente na formação de custos, certamente tem o seu valor, mas ter a capacidade de interiorizar os custos evento a evento e fazer análises automáticas e manuais o tempo todo, de forma inteligente e associado às decisões de negócio em todos os níveis da empresa, já é uma possibilidade que deveria estar nos planos dos usuários e dos fornecedores de ERP.
Poderíamos trabalhar inúmeros outros pontos relacionados aos custos, tais como realinhamento de custos através de regressão de impactos, utilização adaptada dos custos semifixos e semivariáveis e análises combinadas de custos, mas, o ponto principal é que você entenda a importância da gestão de custos no seu negócio, o quanto os ERP são relevantes para isso e os principais pontos de fragilidade e oportunidades dos modelos atuais.
Mãos e mentes à obra!!!
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